Helena P. Blavatsky A Doutrina Secreta.
Helena P. Blavatsky A Doutrina Secreta.
HELENA PETROVNA BLAVATSKY
A DOUTRINA SECRETA
Síntese de Ciência, Filosofia e Religião
Tradução de
RAYMUNDO MENDES SOBRAL
VOLUME I COSMOGÊNESE
EDITORA PENSAMENTO
São Paulo
2
Esta obra
é dedicada aos verdadeiros Teósofos de todos os países,
seja qual for a raça a que pertençam. Eles a solicitaram e para eles foi escrita.
HELENA PETROVNA BLAVATSKY
3
NOTA DO TRADUTOR
ESTA é a primeira tradução completa, em língua portuguesa, da
monumental obra de Helena Petrovna Blavatsky — THE SECRET DOCTRINE, cuja
edição original saiu impressa no ano de 1888, simultaneamente em Londres e Nova
Iorque. Contém todos os prefácios, anotações, apêndice e notas adicionais insertos
na última edição inglesa, a de 1938, chamada Edição de Adyar.
Observar-se-á que foi aqui respeitada a grafia original dos nomes próprios
que não têm forma vernácula ou tradução consagrada em português, e de alguns
outros que, apesar de o terem, nos pareceu conveniente não alterar, a fim de melhor
evidenciar os étimos que entraram em sua formação, e facilitar a percepção da idéia
oculta e filosófica que encerram, e das identidades e analogias conceptuais com
outros nomes, que nos depara o estudo das escrituras e sistemas religiosos e
cosmogônicos, assim exotéricos como esotéricos, de todas as nações e de todos os
tempos. Estão nesse caso, por exemplo, os nomes: Brahtna, Buddha, Krishna,
Jehovah, Elohim; além de outros, que o leitor discernirá sem dificuldade.
Que a presente tradução contribua para tornar mais acessíveis e difundir,
entre os que falam a nossa língua, os conhecimentos e a sabedoria revelados e
transmitidos à humanidade, em fins do século passado, por aquela Mestra
incomparável que foi H.P.B., outro não é o objetivo ou o desejo do tradutor. E, para
os erros ou imperfeições, a que certamente não foi imune, na realização de sua
tarefa, exora a indulgência do leitor.
R. M. S.
Rio de Janeiro, 1969.
4
ÍNDICE
PREFÁCIO DA PRIMEIRA EDIÇÃO...........................................................................6
PREFÁCIO DA TERCEIRA EDIÇÃO REVISTA........................................................21
PREFÁCIO DA QUARTA EDIÇÃO ...........................................................................22
H. P. BLAVATSKY: SINOPSE DE SUA VIDA...........................................................26
COMO FOI ESCRITA A DOUTRINA SECRETA.......................................................34
INTRODUÇÃO..........................................................................................................64
VOLUME I ...............................................................................................................108
COSMOGÊNESE....................................................................................................108
PROÊMIO ...............................................................................................................108
PÁGINAS DE UNS ANAIS PRÉ-HISTÓRICOS ......................................................108
PARTE I: A EVOLUÇÃO CÓSMICA .......................................................................139
SETE ESTÂNCIAS DO LIVRO SECRETO DE DZYAN (com comentários)............139
A EVOLUÇÃO CÓSMICA NAS SETE ESTÂNCIAS DO LIVRO DE DZYAN ..........141
ESTÂNCIA I.........................................................................................................141
ESTÂNCIA II........................................................................................................142
ESTÂNCIA III.......................................................................................................142
ESTÂNCIA IV ......................................................................................................144
ESTÂNCIA V .......................................................................................................146
ESTÂNCIA VI ......................................................................................................147
ESTÂNCIA VII .....................................................................................................149
COMENTÁRIOS......................................................................................................151
AOS TEXTOS E EXPRESSÕES DAS SETE ESTÂNCIAS.................................151
ESTÂNCIA I.........................................................................................................151
ESTÂNCIA II........................................................................................................174
ESTÂNCIA III.......................................................................................................186
ESTÂNCIA IV ......................................................................................................218
ESTÂNCIA V .......................................................................................................246
ESTÂNCIA VI ......................................................................................................289
UMA DIGRESSÃO...........................................................................................312
ALGUNS CONCEITOS TEOSÓFICOS PRIMITIVOS ERRÔNEOS
REFERENTES AOS PLANETAS, ÀS RONDAS E AO HOMEM......................314
FATOS E EXPLICAÇÕES ADICIONAIS REFERENTES AOS GLOBOS E ÀS
MÔNADAS.......................................................................................................343
ESTÂNCIA VI (Continuação) ...............................................................................378
ESTÂNCIA VII .....................................................................................................411
RESUMO.................................................................................................................495
EXCERTOS DE UM COMENTÁRIO PRIVADO MANTIDO EM SEGREDO ATÉ
AGORA ............................................................................................................526
NOTAS ADICIONAIS.........................................................................................545
BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................548
REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS MODERNAS ......................................................552
LIVROS ADICIONAIS PARA REFERÊNCIA .......................................................553
GLOSSÁRIO...........................................................................................................558
DE TERMOS EMPREGADOS NAS SETE PRIMEIRAS ESTÂNCIAS DO LIVRO
DE DZYAN...........................................................................................................558
ESTÂNCIA I .....................................................................................................558
5
ESTÂNCIA II ....................................................................................................559
ESTÂNCIA III ...................................................................................................560
ESTÂNCIA IV...................................................................................................561
ESTÂNCIA V....................................................................................................563
ESTÂNCIA VI...................................................................................................564
ESTÂNCIA VII..................................................................................................566
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6
SUMARIO
· Prefácio da Primeira Edição
· Prefácio da Terceira Edição Revista
· Prefácio da Quarta Edição (Edição de Adyar)
· H. P. Blavatsky: Sinopse de sua vida
· Como foi escrita A Doutrina Secreta
· Introdução
1. A necessidade de um livro desta espécie.
2. A antigüidade dos Documentos e Manuscritos.
3. O objetivo desta obra.
Volume I
COSMOGÊNESE
· Proêmio - Páginas de uns anais pré-históricos
1. O mais antigo Manuscrito do Mundo e seu Simbolismo
2. A Vida Una, Ativa e Passiva
3. A Doutrina Secreta
4. Panteísmo
5. Ateísmo
6. "O Espaço" em todas as Religiões e no Ocultismo
7. Os sete Elementos Cósmicos
8. Às sete Raças da Humanidade
9. As três proposições fundamentais da Doutrina Secreta
10. Descrição das Estâncias do Livro de Dzyan.
7
Parte I
A Evolução Cósmica
Sete Estâncias do "Livro Secreto de Dzyan" com Comentários
· A evolução cósmica nas sete estâncias do Livro de Dzyan
· Comentários
· Estância I — A Noite do Universo
1. As Sete Eternidades
2. O Tempo
3. A Mente Universal e os Dhyân-Chohans
4. Nidânas ou Causas da Existência Mâyâ ou Ilusão
5. Trevas, a Matriz Eterna
6. Os Princípios masculino e feminino na Natureza-Raiz
7. Os Sete Espíritos Criadores, os Dhyân Chohans
8. O Grande Sopro
9. A Causa do Universo Material
10. O Ser Uno é o Número de todos os Números
11. A Forma Una de Existência
12. O olho aberto de Dangma, um Jivanmukta
13. Âlaya, a Vida Una, ou Alma Universal
14. O Mistério do Ser Absoluto
15. O mistério da hierarquia dos Anupâdaka.
· Estância II — A Idéia de Diferenciação
8
1. Os Construtores
2. Paranishpanna
3. O Absoluto
4. A diferença entre o Ser consciente e o Inconsciente
5. Espaço, o Elemento Eterno e Único
6. A Consciência Absoluta contém o Conhecedor
7. O Raio de Vida penetra no "Germe"
8. O Lótus, símbolo do Cosmos
9. O Quaternário: Pai-Mãe-Filho, como Unidade
10. O Filho: em cima, é todo o Cosmos; em baixo, é a Humanidade
11. Svabhâvat; a Essência Plástica Universal de Mülaprakriti
12. O Universo ainda estava oculto no Pensamento Divino.
· Estância III — O Despertar dos Cosmos
1. Mahat (Inteligência Universal), o primogênito de Sabedoria
2. A última Vibração
3. O significado esotérico de Manvantara
4. O Sopro Eterno se move sobre as Águas da Vida, Caos
5. O Pensamento Divino impregna o Caos
6. O Ovo Virginal como símbolo do Universo
7. O Poder dos Números
8. O simbolismo Oculto
9. A Luz, o Onipresente Raio Espiritual
10. As Trevas, única realidade verdadeira
9
11. O resplandecente Dragão de Sabedoria
12. A Substância Cósmica se converte em Matéria Astral
13. O Fogo, a Inteligência que move o Universo
14. O Mistério dos Números
15. O Cisne, símbolo do Raio divino
16. Eletricidade, a Vida Una
17. Os primeiros Dhyân Chohans são "Naturezas Primárias"
18. A Trama do Ser
19. Fohat põe a Matéria Cósmica em Movimento
20. A Trama dilata-se e contrai-se
21. Fohat, a Eletricidade Cósmica.
· Estância IV — As Hierarquias Setenárias
1. Os "Filhos do Fogo"
2. Os Sete Sentidos Místicos
3. "Não-Número", seu Significado
4. Os Primeiros Seres "Primordiais"
5. A Ciência Sagrada dos Números
6. Os Animais Sagrados
7. O Mistério do Som e da Linguagem
8. O "Exército da Voz", ou a "Palavra"
9. A Alegoria oculta da Linguagem e da Mente
10. A Matéria Cósmica constituindo-se em Elementos
11. Svabhâvat, a Raiz plástica da Natureza física
10
12. O Círculo sem Limites
13. O Sol de nosso Sistema, o "Excluído"'
14. A Doutrina Secreta da Evolução dos Planetas
15. Os Sóis são os Primeiros Centros de Força
16. Os Lipika, Registradores da Lei de Retribuição no Livro da Vida.
· Estância V — Fohat, o Filho das Hierarquias Setenárias
1. Filhos da Luz
2. A raiz do Homem Espiritual se converte em Divina por meio da própria
experiência Cada Átomo possui potencialmente o Eu-consciência
3. Os sete Dhyân-Budhas
4. Fohat, a Força Criadora Potencial
5. A Mente Universal representa as Legiões dos mais elevados Dhyân
Chohans criadores
6. O Sistema Solar é constituído por sete Princípios Fohat, em seu
aspecto secundário, é a Energia Solar
7. Os "Três" e os "Sete" grandes passos de Vishnu
8. Círculos, curvas e Chakras
9. O Sete, um Número Sagrado i
10. A Lei de Movimento vertical
11. A Evolução dos Princípios da Natureza
12. A Unidade, uma lei fundamental na Ciência Oculta
13. O Mistério do Fogo
14. O Regente Celeste dos Quatro Pontos Cardeais
11
15. O significado real do Tabernáculo
16. O caráter das Rodas Aladas
17. Os Espíritos Planetários e os Lipika
18. O Anel "Não pássaras"
19. O Dia "Vem a Nós".
· Estância VI — Nossso Mundo, seu Crescimento e Desenvolvimento
1. A Mãe, ou Matéria abstrata e ideal, a Raiz da Natureza
2. Palavra, Voz e Linguagem
3. Os Centros Laya são pontos de diferenciação
4. Fohat, o Espírito guia da Lei e da Vida
5. Os Átomos da Ciência
6. A Evolução dos Elementos
7. Ilusão e Realidade
8. As Forças da Natureza
9. O Átomo Primordial, como "Soma Total", carece de Limites.
· Alguns Conceitos Teosóficos Primitivos Errôneos Referentes aos Planetas,
às Rondas e ao Homem
1. Princípios do Homem e Divisão Planetária
2. Classificação dos Princípios do Homem
3. A Transmigração do Homem através de diferentes reinos
4. A Cadeia Setenária
12
5. Explicações acerca da "Quinta" e da "Sexta Ronda". Marte e Mercúrio
em relação ao nosso Sistema Solar
6. Aquisição de Conhecimentos e Poderes
7. O Problema das 777 Encarnações
8. Os sete Ramos da Árvore do Conhecimento.
· Fatos e Explicações Adicionais Referentes aos Globos e às Mônadas
1. As Mônadas estão divididas em sete Classes ou Hierarquias
2. A Terra e as Cadeias Lunares
3. A Terra, Filha da Lua
4. As Legiões Monádicas classificadas
5. A Mônada floresce na Mônada Divina
6. A Mônada Espiritual é Ünica, e Universal
7. As sete Classes de Pitris Lunares
8. Um tríplice esquema evolutivo na Natureza
9. O estado humano
10. Não podem entrar mais Mônadas, a Porta está fechada
11. A Doutrina Secreta e a Teoria de Darwin
12. Os Dhyân Chohans encarnados na Terceira Raça-Raiz
13. Os Antepassados dos Símios.
· Estância VI — Continuação
1. A Quarta Ronda, o Equilíbrio entre o Espírito e a Matéria
13
2. A Queda do Espírito na Matéria
3. A Primeira Causa do Pecado
4. O Mistério da "Tetraktys"
5. Significado de Satã
6. Os mundos "sem forma" e os Mundos "formativos"
7. A Guerra no Céu
8. O Nascimento dos Mundos
9. A Vitalidade Cósmica e Terrestre (Eletricidade)
10. Uma Idade de Brahmâ
11. Quatro Graus de Iniciação
12. Os Filhos da Vontade e do Yoga
13. O Iniciado Ünico e a Ilha Sagrada
14. Filhos de Kriyâshakti — O Sopro de Vida.
· Estância VII — Os Progenitores do Homem na Terra
1. A Hierarquia dos Poderes Criadores
2. Os Sopros Igneos Informes ou Tríade Sephirothal Superior
3. O "Homem Celeste" ou Adão Kadmon
4. A Primeira Ordem de Seres Celestiais
5. Uma Chama-Pai; Inumeráveis Chamas
6. A Segunda Ordem: Fogo e Éter
7. A Terceira Ordem: Âtma-Buddhi-Manas
8. A Quarta Ordem: os "Jivas Imperecíveis"
9. A Quinta Ordem: a Estrela de cinco pontas, que representa o Homem
14
10. As Ordens Sexta e Sétima, e as qualidades inferiores do Quaternário
11. O Mistério do Ser
12. O Ser Humano, Um Mistério esotérico Tríplice
13. O Mistério Oculto da Antropografia
14. O Homem promana de um Homem Celeste
15. O significado de uma "Ronda"
16. Arcanjos e Demônios
17. A Tríade Espiritual Imortal
18. O Fio da Vida
19. Metafísicos Caldeus
20. Doutrinas Ocultas e Cabalísticas
21. A Mônada é um Raio do Absoluto
22. O Homem Perfeito
23. A Vida e as Vidas
24. As Quatro Dimensões do Espaço
25. Permeabilidade, o próximo Sentido
26. Rondas e Dimensões
27. A Química Oculta
28. O Símbolo do "Sanctum Sanctorum"
29. A Mônada é um Dhyân Chohan Individual
30. A Terra povoada desde os Céus.
· Resumo
1. Ocultismo nos Upanishads
15
2. O poder e a importância do Ocultismo
3. A natureza dos Homens Celestes
4. O Espírito é dotado de Inteligência
5. Os Dhyân Chohans são duplos em seus caracteres
6. A Matéria Eterna é a Sombra do Espírito
7. A Eternidade das Formas Humanas
8. O Vishnu Purana e Hermes Trismegisto comparados
9. Alguns Aforismos Ocultos
10. As Sete Shaktis (forças)
11. Tudo é Relativo
12. Os Ocultistas são os campeões da Verdade.
· Notas Adicionais
· Bibliografia
· Glossário
16
Índices de Figuras
Figura 1: DIAGRAMA I ............................................................................................315
Figura 2: DIAGRAMA II ...........................................................................................346
Figura 3: CADEIA LUNAR.......................................................................................346
Figura 4: CADEIA TERRESTRE .............................................................................346
Figura 5: DIAGRAMA III ..........................................................................................392
Figura 6: DIAGRAMA IV..........................................................................................456
Índice de Quadros
Quadro 1: DIVISÃO SETENÁRIA EM DIFERENTES SISTEMAS HINDUS............322
Quadro 2 .................................................................................................................457
Quadro 3 .................................................................................................................458
17
PREFÁCIO DA PRIMEIRA EDIÇÃO
A AUTORA — ou mais propriamente a escritora — sente-se no dever de
justificar a demora no aparecimento desta obra. As causas foram o seu estado de
saúde e a magnitude do empreendimento. Os dois volumes que saem à luz ainda
não completam o plano, nem esgotam o assunto que lhes constitui o objeto. Já se
acha preparada boa quantidade de materiais referentes à história do Ocultismo,
proporcionados pelas vidas dos grandes Adeptos da Raça ariana e que nos
mostram a influência da Filosofia Oculta no comportamento da vida, tal como é e
como deve ser. Se os presentes volumes tiverem acolhida favorável, não serão
poupados esforços para levar avante e completar a obra.
Quando pela primeira vez se anunciou a elaboração deste trabalho, não
era o plano atual que se tinha em vista. Conforme fora noticiado de início, havia a
intenção de que a Doutrina Secreta representasse uma versão ampliada e corrigida
de Ísis sem Véu. Não se tardou, porém, a verificar que as explicações a serem
dadas ao mundo, em aditamento às constantes do último livro, e de outros que
também se ocuparam da Ciência Esotérica, exigiam, por sua natureza, um método
diferente de exposição; e é por isso que os volumes atuais não contêm, em sua
totalidade, sequer vinte páginas reproduzidas de Ísis sem Véu.
A autora não julga necessário pedir a indulgência dos leitores e dos
críticos para os numerosos defeitos no tocante ao estilo literário e ao manejo da
língua inglesa, que possam ser observados nestas páginas. É uma estrangeira, e o
conhecimento desse idioma lhe veio em idade já algo avançada. O inglês foi
18
adotado por ser o meio de mais ampla difusão para servir de veículo às verdades
que lhe cumpre apresentar ao mundo.
Tais verdades não são, de modo algum, expostas com o caráter de
revelação; nem a autora tem a pretensão de se fazer passar por uma reveladora de
conhecimentos místicos que fossem agora trazidos à luz pela primeira vez na
história. A matéria contida nesta obra pode-se encontrar esparsa nos milhares de
volumes que encerram as Escrituras das grandes religiões asiáticas e das primitivas
religiões européias — oculta sob hieróglifos e símbolos, e até então despercebida
por causa desse véu. O de que aqui se cogita é reunir as mais antigas doutrinas e
sobre elas formar um conjunto harmônico e contínuo. A única vantagem em que
sobrelevo aos meus predecessores é a de não precisar recorrer a especulações ou
teorias pessoais. Porque esta obra não representa mais do que uma exposição
parcial de ensinamentos recebidos de estudantes mais adiantados, com o
adminículo tão-somente, no que concerne a alguns pormenores, dos resultados do
meu próprio estudo e observação. A publicação de muitos dos fatos aqui
mencionados torna necessária em razão das estranhas e fantásticas especulações a
que se deram vários teósofos e estudantes de misticismo nestes últimos anos, no
afã de construírem um sistema completo, deduzido do pequeno número do fatos que
lhes foram transmitidos.
Escusado é dizer que esta obra não é a Doutrina Secreta em sua
totalidade; contém apenas um número selecionado de fragmentos dos seus
princípios fundamentais, dando-se especial atenção a certos fatos com os quais
diversos, escritores se têm preocupado, desfigurando-os, porém, ao ponto de retirarlhes
toda verossimilhança.
19
Apesar disso, será talvez conveniente declarar, em termos inequívocos,
que os ensinamentos consubstanciados nestes dois volumes, por mais incompletos
e fragmentários que sejam, não pertencem exclusivamente nem à religião hindu,
nem à de Zoroastro, nem à da Caldéia, nem à egípcia; e tampouco ao Budismo, ao
Islamismo ou ao Cristianismo. A Doutrina Secreta é a essência de todas elas. E
como os diferentes sistemas religiosos tiveram sua origem na Doutrina Secreta,
trataremos de fazê-los retroagir ao seu elemento original, de onde todos os mistérios
e dogmas se desenvolveram, vindo a materializar-se.
É bem provável que grande parte do público considere a obra como uma
novela das mais extravagantes. Quem já ouviu alguma vez falar do Livro de Dzyan?
Sem embargo, está a escritora resolvida a assumir inteira
responsabilidade por tudo quanto se contém neste livro, e ainda arrostar com a
acusação de haver tudo inventado. Que há muitas deficiências, ela o sabe
perfeitamente; mas a única coisa que deseja e solicita em favor da obra é que,
embora a muitos se afigure romântica, a sua tessitura lógica e a sua coerência
confiram títulos a este novo Gênesis, que o ponham ao nível, pelo menos, das
'hipóteses fecundas' tão livremente aceitas pela Ciência moderna. A obra, ademais,
merece ser considerada, não porque invoque alguma autoridade dogmática, mas por
se manter em íntima relação com os fatos da Natureza c seguir as leis da
uniformidade e da analogia.
O objetivo deste trabalho pode ser assim expresso: demonstrar que a
Natureza não é 'uma aglomeração fortuita de átomos', e assinar ao homem o lugar
que por direito lhe compete no plano do Universo; evitar que sejam desvirtuadas as
verdades arcaicas que constituem a base de todas as religiões; descobrir, até certo
ponto, a unidade fundamental que se acha na raiz de todas elas; e, finalmente,
20
mostrar que a Ciência da civilização hodierna jamais se aproximou do lado Oculto da
Natureza.
Se isso for de algum modo conseguido, a autora dar-se-á por satisfeita.
Ela escreveu a serviço da Humanidade; deve ser julgada pela Humanidade e as
gerações futuras. Não reconhece tribunal de apelação inferior a esse. Esta
acostumada as injúrias, e em contato diário com a calúnia; e encara a maledicência
com um sorriso de silencioso desdém.
De minimis non curat Lex.
H.P.B.
Londres, outubro de 1888
21
PREFÁCIO DA TERCEIRA EDIÇÃO REVISTA
Ao PREPARAR esta reedição para ser impressa, procuramos corrigir
alguns pormenores de pouca importância, no que respeita à forma literária, sem
tocar, de leve que fosse, nos assuntos de mais elevado alcance. Se a nova edição
viesse à luz ainda em vida de H. P. Blavatsky, sem dúvida que ela a teria corrigido e
ampliado consideravelmente. Que tal coisa não houvesse acontecido, é uma das
muitas perdas menores ocasionadas pela grande perda.
Corrigiram-se as frases obscuras, devidas ao imperfeito conhecimento do
inglês; comprovou-se a maior parte das citações, e as referências foram
consignadas com exatidão - tarefa sobremodo penosa, pois nas primeiras edições
as referências constaram, não raro, de forma algo imprecisa; adotou-se também um
sistema uniforme para a transliteração das palavras sânscritas. Repudiando a forma
geralmente preferida pelos orientalistas do Ocidente, como passível de induzir em
erro o leitor, demos às consoantes que não existem no alfabeto inglês combinações
capazes de exprimir aproximadamente os respectivos valores sonoros, e sinalamos
com todo o cuidado as quantidades sobre as vogais, sempre que necessário. Em
alguns casos fizemos incorporar notas ao texto, mas usando de bastante parcimônia
e somente quando aquelas, evidentemente, podiam integrá-lo.
Acrescentamos ainda um índice minucioso1 , para ajudar os estudantes, e
o fizemos constar de volume em separado, a fim de facilitar as buscas. Devemos a
magna tarefa de sua elaboração a Mr. A. J. Faulding.
ANNIE BESANT
G. R. S. MEAD
Londres, 1893.
1 Esse índice ainda não foi traduzido para o português (N.doT.)
22
PREFÁCIO DA QUARTA EDIÇÃO
(EDIÇÃO DE ADYAR)
PARA COMEMORAR o cinqüentenário da publicação de A DOUTRINA
SECRETA, ficou assente que seria promovida, em Adyar, uma nova e completa
edição em seis volumes de fácil manuseio, tornando a obra acessível ao grande
público, a um preço assaz reduzido, praticamente o preço de custo.
Graças à "Fundação Blavatsky", organização que tem por objetivo difundir
e divulgar os grandes ensinamentos da Teosofia, foi possível a realização do
empreendimento, assim como o preparo de outras publicações da literatura
teosófica. Aqui ficam os nossos agradecimentos.
Só em Adyar podia levar-se a termo esta edição de A DOUTRINA
SECRETA. E isso porque, além de indispensável o concurso da experiência dos
membros mais versados em Teosofia e na história da Sociedade Teosófica, havia
mister de freqüentes consultas aos arquivos da Sociedade, onde se conservam os
elementos originais a que se devia recorrer para o necessário confronto dos textos
impressos com os manuscritos e cartas, e para a certeza da feitura de uma edição o
mais possível conforme às intenções originais de Blavatsky.
A edição, de qualquer modo, não estaria completa se não abrangesse
aquela parte que foi considerada como o terceiro volume, e que certas pessoas,
laborando em erro, julgavam não pertencer propriamente à obra de Blavatsky.
Existem provas internas de que esse terceiro volume inclui boa quantidade de
matéria que ela preparou para ulterior publicação, achando-se em Adyar as cópias
dos manuscritos originais, com a letra da Condessa de Wachtmeister e,
possivelmente, a de outros auxiliares.
23
A fim de facilitar o estudo desta monumental obra, julgamos de interesse
acrescentar o seguinte:
· "Como foi escrita A DOUTRINA SECRETA", compilação dos Anais e
Registros da Sociedade.
· "H. P. Blavatsky: Sinopse de sua Vida".
· Bibliografia (no fim de cada volume).
· Um Glossário resumido (em aditamento ao índice).
Os índices foram revistos. Para o quinto volume (antigo volume III),
elaborou-se mais um Índice, inteiramente novo.
Incluíram-se em cada volume, à guisa de referência, os nomes de várias
obras científicas, e de outros livros.
Sinto-me particularmente feliz em ver o meu mandato de Presidente
assinalado com a republicação da obra que contém a mais importante revelação da
Eterna Sabedoria nos tempos modernos, assim posta ao alcance de todos, e
manifesto a minha gratidão a quantos contribuíram para tornar possível esta
realidade.
Desejo mui especialmente agradecer a um dos mais talentosos
estudantes de A DOUTRINA SECRETA, e grande autoridade na matéria, a Sra.
JOSEPHINE RANSOM, por haver-se consagrado com toda a alma à supervisão dos
trabalhos, durante considerável espaço de tempo. Sem ela, não teria vindo à lume a
nova edição. Coube-lhe o exame atento e cuidadoso das mínimas particularidades,
de modo que cada palavra, em cada página, fosse, o mais possível, a vera
expressão de sua eminente autora. A Sra. Ransom desempenhou, com maestria, a
24
tarefa de fundir em uma as edições de 1888 e 1893; assim, absolutamente nada se
perdeu da edição de 1888, e, ao mesmo tempo, certas transposições, ditadas por
conveniências de leitura, e que constituem a principal diferença entre as duas
edições, foram fielmente observadas na Edição de Adyar. Deste modo, a Edição de
Adyar representa, em verdade, duas edições em uma.
Faltaríamos ao nosso dever para com os leitores de A DOUTRINA
SECRETA se deixássemos em silêncio a cooperação dedicada e inteligente de dois
dos maiores discípulos de H. P. Blavatsky - Annie Besant e G. R. S. Mead.
A Sra. Ransom contou ainda, nos seus trabalhos de maior
responsabilidade, com a ajuda de numerosos estudantes. A todos eles, também os
nossos sinceros agradecimentos.
O preparo geral e a revisão foram orientados e dirigidos pela Sra.
Ransom, assistida pelos Srs. A. J. Hamerster e Sidney Ranson. A Sra. Ethelwyn M.
Amery tomou a si o encargo da revisão, com o auxílio de alguns colaboradores
voluntários. O Sr. Rohit Mehta cooperou de modo eficiente na organização do novo
índice, tarefa sobremaneira cansativa. Os trabalhos de pesquisa foram efetuados
pela Srta. G. Watkins, bibliotecária de Adyar, pelos Pandits da Biblioteca de Adyar,
especialmente na parte relativa às línguas sânscritas, tibetana e chinesa, e por
companheiros daqui e de outros países no tocante aos textos em grego, latim e
hebraico. O Sr. Hirendranath Datta, vice-presidente da Sociedade Teosófica, prestou
valiosa assistência nos assuntos relacionados com a Filosofia Hindu. Devo
igualmente agradecer a diversos membros da Sociedade Teosófica na Inglaterra,
que se incumbiram de verificar as citações de obras antigas que não existiam na
Biblioteca de Adyar, e também as referências a obras de caráter científico.
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A fase última da apresentação da nova edição coube às mãos hábeis do
Sr. H. J. Nt van de Poll, Administrador Honorário da Casa Publicadora Teosófica, de
Adyar, e às do Sr. C. Subbarayudu, Superintendente da Imprensa Vasanta, de
Adyar.
Foi, assim, no Quartel-General da Sociedade Teosófica, o verdadeiro lar
de H. P. Blavatsky, onde ainda se respira a fragrância da irradiante atmosfera que
ela criou, e onde se sente o influxo de sua admirável obra, que demos início à
presente reencarnação daquele forte jorro espiritual, produto da atividade criadora
dos dois Fundadores Ocultos da Sociedade Teosófica e de sua principal
colaboradora no mundo externo; obra que recebeu forma definitiva em 1888, com A
DOUTRINA SECRETA.
Pela influência do Segundo Logos, eles criaram em 1875 a forma -
Sociedade Teosófica. Pela influência do Terceiro Logos, eles infundiram em 1888 a
vida - A DOUTRINA SECRETA.
Em 1893 esta vida foi renovada. Em 1938 opera-se mais uma renovação.
Portanto, H. P. Blavatsky será sempre considerada como aquele ser de
quem, sob a inspiração dos Fundadores Ocultos, promanou a vida que há de um dia
construir um mundo inteiramente novo.
No exercício de seu apostolado, ela foi perseguida e caluniada. Mas
tempo virá em que ela será conhecida pelo que realmente foi: um Portador de Luz
da nova era.
GEORGE S. ARUNDALE
Presidente da Sociedade Teosófica
Adyar, 1938.
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H. P. BLAVATSKY: SINOPSE DE SUA VIDA
HELENA PETROVNA BLAVATSKY foi uma das figuras mais notáveis do
mundo no último quartel do século XIX. Ela abalou e desafiou de tal modo as
correntes ortodoxas da Religião, da Ciência, da Filosofia e da Psicologia, que é
impossível ficar ignorada. Foi uma verdadeira iconoclasta — ao rasgar e fazer em
pedaços os véus que encobriam a Realidade. Mas, porque estivesse a maioria presa
às exterioridades convencionais, tornou-se o alvo de ataques e injúrias, pela
coragem e ousadia de trazer à luz do dia aquilo que era blasfêmia revelar. Lenta
mas seguramente, os anos se encarregaram de fazer-lhe justiça. Apesar das
invectivas, considerava-se feliz por trabalhar "a serviço da humanidade”, e deu
provas de sabedoria ao deixar que as futuras gerações julgassem a sua magnífica
obra2.
Helena Petrovna Hahn nasceu prematuramente à meia-noite de 30 para
31 de julho (12 de agosto pelo calendário russo) de 1831, em Ekaterinoslav, na
província do mesmo nome, ao sul da Rússia. Tão estranhos foram os incidentes
ocorridos na hora do seu nascimento e por ocasião do seu batismo, que os serviçais
da família lhe predisseram uma existência cheia de tribulações.
Helena foi uma criança voluntariosa, oriunda de uma linhagem tradicional
de homens e mulheres influentes e poderosos. A história dos seus antepassados é a
história mesma da Rússia. Séculos atrás, os nômades eslavos erravam através da
Europa central e oriental. Tinham formas de governo próprias; mas, quando se
estabeleceram em Novgorod, fracionaram-se em feudos, que se desavieram entre
2 Veja-se o Prefácio de H.P.B. à edição de 1888.
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si, não sendo possível chegarem a uma conciliação. Chamaram em seu auxílio Rurik
(862 A.D.), chefe de uma das tribos errantes de "Russ", homens do Norte ou
escandinavos, que andavam à cata de mercado e procurando estender o seu
domínio. Rurik veio e organizou em Novgorod o primeiro governo civil, que se
constituiu em um centro opulento de comércio com o Oriente e o Ocidente. Foi ele o
primeiro soberano e reinou pelo espaço de quinze anos. Durante sua vida, o filho
Igor e o sobrinho Oleg consolidaram-lhe o domínio no Oeste e no Sul. Kiev tornou-se
um grande Principado, e aquele que o governava era virtualmente o soberano da
Rússia. Ao longo dos séculos, os descendentes de Rurik ampliaram as suas
conquistas e a sua autoridade sobre todo o país. Vladimir I (m. 1015) escolheu o
Cristianismo como religião do seu povo, e o chamado "paganismo" desapareceu.
Yaroslav o Sábio (m. 1034) elaborou Códigos e os "Direitos Russos". O sexto filho
de Vladimir II (1113-24) foi Yuri, o ambicioso ou "dolgorouki". Este apelido persistiu
como título de família. Yuri fundou Moscou, e sua dinastia deu origem aos poderosos
Grão-Duques, cujos governos se caracterizaram por lutas violentas entre eles
próprios. As hordas mongóis, em 1224, tiraram partido das divergências e sujeitaram
os grupos turbulentos que se rivalizavam em sede de poder e posição. Mas Ivan III,
um Dolgorouki, libertou-se em 1480 do jugo mongol; e Ivan IV exigiu ser coroado
Czar, arrogando-se a autoridade suprema. Com a morte de seu filho terminou a
longa e brilhante dinastia dos Dolgorouki. Mas a família ainda exercia influência nos
dias dos Romanoff, até a morte da avó da Senhora Blavatsky, a talentosa e culta
Princesa Elena Dolgorouki, que se casou com André Mikaelovitch Fadeef, o "mais
velho" da linhagem Dolgorouki, da qual os Czares Romanoff eram considerados um
dos ramos "mais novos".
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Vê-se, pois, que a família de Helena pertencia à classe superior, na
Rússia, com tradição e dignidade a preservar, sendo conhecida em toda a Europa.
Helena era uma rebelde, e desde a infância sempre manifestou desprezo pelas
convenções, o que não a impedia de compreender que as suas ações não deviam
molestar a família, nem ferir-lhe a honra. Seu pai, o Capitão Peter Hahn, descendia
de velha estirpe dos Cruzados de Mecklemburg, os Rottenstern Hahn. Em virtude
de, aos onze anos de idade, haver perdido a mãe, mulher inteligente e devotada à
literatura, Helena passou a adolescência em companhia de seus avós, os Fadeef,
em um antigo e vasto solar de Saratov, que abrigava muitos membros da família e
grande número de criados e servidores, por ser o seu avô Fadeef governador da
província de Saratov.
A natureza de Helena estava fortemente impregnada de uma inata
capacidade psíquica, de tal modo que constituía sua característica predominante.
Ela se dizia (e o demonstrava) dotada da faculdade de comunicar-se com os
habitantes de outras esferas ou mundos invisíveis e sutis, e com os entes humanos
que consideramos "mortos". Essa potencialidade natural foi posteriormente
disciplinada e desenvolvida. Sua educação recebeu a influência da posição social da
família e dos fatores culturais então imperantes. Assim, ela era hábil poliglota e tinha
excelentes conhecimentos musicais; de sua erudita avó herdou o senso científico e a
experiência; e partilhava dos pendores literários que pareciam correr nas veias da
família.
Em 1848, com a idade de 17 anos, Helena contraiu matrimônio com o
General Nicephoro V. Blavatsky, governador da província de Erivan, que era um
homem já entrado em anos. Existem muitas versões sobre a razão desse
casamento; que não foi do seu agrado, ela o demonstrou desde o primeiro
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momento. Após três meses, abandonou o marido e fugiu para a casa da família, que
a encaminhou ao pai. Receando ser obrigada a voltar para o General Blavatsky,
tornou a fugir, no caminho; e durante vários anos correu o mundo em viagens cheias
de aventuras. O pai conseguiu comunicar-se com ela e fez-lhe remessa de dinheiro.
Ao que parece, manteve-se e